Artigo de opinião in Jornal do Fundão
Sílvia Socorro (Coordenadora do Centro de Investigação em Ciências da Saúde da Universidade da Beira Interior)
O jornal britânico The Telegraph noticiava na passada semana que a taxa de testes de rastreio à COVID-19 em Portugal é mais do dobro daquela que é observada noutros países. Os dados apresentados à data da publicação colocavam Portugal num honroso sexto lugar, com ~67 testes/1000 habitantes, logo a seguir à Dinamarca, e muito acima de países como a Suécia, a Noruega, ou o Reino Unido. Esta brilhante performance, diria eu, foi conseguida em grande parte devido aos esforços e capacidade de adaptação do sector privado e do mundo académico face à situação pandémica que nos assolou. A mobilização geral das instituições de ensino superior e unidades de investigação, de norte a sul do país, com a implementação de laboratórios de testes para a deteção do SARS-CoV-2 criou um potencial acrescido de rastreio e diagnóstico que possibilitou atingir números de testagem que de outra forma seria impensável serem alcançados.
O Centro de Investigação em Ciência da Saúde da Universidade da Beira Interior (CICS-UBI), uma unidade de investigação de uma “jovem” universidade portuguesa localizada no interior do país, faz parte do grupo de instituições a nível nacional que estão a contribuir para o controlo da COVID-19. No final do mês de março, consequência das necessidades das autarquias da região da Cova da Beira, apresentou-se-nos o desafio de instalar um laboratório de testes. Não podendo ficar indiferentes ao imperativo e missão de colocar a ciência ao serviço da comunidade, foi altura de agir. Com o know-how, esforço e dedicação dos investigadores do CICS-UBI, e alunos e docentes da Faculdade de Ciências da Saúde (FCS), no dia 20 de abril o laboratório de testes do CICS-UBI/FCS era uma realidade. Para este marco contribuiu também a colaboração da empresa Labfit, e a parceria com o Centro Hospitalar Universitário da Cova da Beira (CHUCB) que permite, por exemplo, o apoio no registo dos resultados do diagnóstico no Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica.
Com o altruísmo e voluntarismo dos envolvidos nesta missão temos vindo a dar resposta às necessidades crescentes de testagem na região. Tendo começado com uma média de cerca de 20 testes por dia, das amostras provenientes dos centros de colheitas Drive-Through da Covilhã e Belmonte, e do centro de colheitas do Fundão, assim como das colheitas ao domicilio em estruturas residenciais para idosos, atingimos na última semana valores entre os 70 e os 95 testes por dia. Isto significou duplicar de uma semana para outra o volume de trabalho realizado. Estes são números que podem ficar aquém dos de unidades de investigação dos grandes centros urbanos, as quais chegam a reportar centenas de testes por dia. Mas a verdade é que estas têm ao dispor equipas maiores e, no geral, várias equipas a trabalhar em simultâneo. No caso do laboratório do CICS-UBI falamos de uma única equipa, a trabalhar apenas num período do dia, o que representa até uma capacidade de trabalho acima da média. Atrever-me-ia a dizer que este é mais um dos exemplos da força do interior e da vontade que move as nossas gentes, as que aqui nasceram e as que cá se instalaram e daqui fizeram a sua casa.
Num cenário de emergência nacional, as instituições do interior, nomeadamente a UBI e o CICS-UBI mostraram estar à altura de responder às necessidades das populações, com o conhecimento existente no seio da universidade a ser disponibilizado para a resolução de um problema urgente. Felizmente, a contribuição do CICS-UBI não se esgota com os testes para a deteção do SARS-CoV-2. Os nossos investigadores estão ainda envolvidos noutras missivas de reconhecido mérito, nomeadamente, no desenvolvimento de novos métodos de diagnóstico para a COVID-19, na aplicação de testes de imunidade às populações, e na implementação de diversas abordagens inovadoras para o combate à pandemia. Em qualquer destas vertentes, a colaboração entre a academia, as instituições de saúde e o poder local terá resultados traduzíveis em benefícios diretos para o bem-estar das pessoas e para a região, representando também uma força motriz para o desenvolvimento do território.